

“Não podemos tratar o PL como um plano para a privatização dos Correios. Na prática, a proposta é muito mais ‘para inglês ver’”, afirmou o economista Marcos Lisboa
Apesar de comumente chamado de “PL da privatização dos Correios”, o Projeto de Lei (PL) 591/21, não trata diretamente sobre a venda da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, mas cria a possibilidade de que a iniciativa privada atue no setor. Assim, abre-se caminho para uma desestatização que pode ocorrer em um segundo momento.
Entregue pessoalmente pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), em 24 de fevereiro, o “PL dos Correios” foi listado como uma das prioridades do governo federal.
Segundo o ministro das Comunicações, Fábio Faria, “os Correios serão privatizados até o final de 2021”. De acordo com a proposta, isso será feito por meio da abertura de capital da empresa, que, apesar de ainda prever a participação do governo, permite a venda de ações na Bolsa de Valores. O projeto também autoriza que o serviço postal seja concedido à iniciativa privada.
Dessa forma, o termo adequado para a situação, ao invés de “privatizar”, seria “desestatizar”. Caso fosse privatizada, a estatal não teria a participação do governo em sua administração.
O texto 591/21 prevê que o estado continue atuando nos Correios por meio do “serviço postal universal”, responsabilidade na entrega de cartas e telegramas. Porém, hoje, a prestação desse serviço é de única responsabilidade do governo, resultando em um monopólio estatal. Caso o projeto seja aprovado, o monopólio será quebrado -, e a atividade poderá ser prestada por empresas privadas que receberem a concessão.
Mesmo assim, a concessionária será obrigada a seguir os preços estabelecidos pelo governo e cumprir metas de universalização e de qualidade definidas dentro da política postal brasileira. O motivo, segundo o governo, é que a Constituição obriga a União a ter o controle do serviço postal e manter correio aéreo nacional.
Na avaliação do economista Marcos Lisboa, presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005), “não é possível tratar o PL como um plano para a privatização dos Correios. Na prática, ele vai apenas quebrar o monopólio que a estatal tem sobre cartas e telegramas. No final das contas, o projeto é muito mais ‘para inglês ver’”.
A entrega de encomendas que não sejam cartas e telegramas já possui a participação da iniciativa privada. Esta prerrogativa foi estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2009 quando estabeleceu que “transportadoras privadas não cometem crime ao entregar outros tipos de correspondências e as encomendas”. Assim, ao comprar na Amazon, por exemplo, você pode decidir não contratar o serviço dos Correios, e sim de outra empresa.
O projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados no início de agosto, e atualmente está na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal. O relatório da matéria é o senador Marcio Bittar (MDB-AC), mas com a proximidade do ano eleitoral, a tramitação pode ser prejudicada.